sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Procura da Poesia

Coleóptero - foto: Rafael Nolli


Poema # 3
                                   para Flávio Offer

Procurando muito há de se encontrar.
Entre os homens que por um segundo
se esquecem de sua natureza e se atracam
– por uma palavra mal acentuada
         ou um gol anulado –
é o palpite mais razoável.

Talvez nem precise ir longe demais:

nada de chafurdar na lama –
onde o esgoto urbano descansa;

nada de vasculhar o sovaco da noite –
onde piolhos fugitivos da púbis se exilam:

por certo é ir longe demais,
não vale a viagem ou a sola de sapato gasta.

Talvez ela esteja por aí, na rua,
passando de chapéu a esconder o rosto,
maquiagem carregada mentindo a face;
ou oculta em uma casa distante e triste:
bastaria chamar no interfone e solicitar.

Quem sabe esteja ao nosso lado
(todo esse tempo ao nosso lado!)
sentada em um ponto de ônibus
aguardando uma condução que lhe dê fuga;
ou em uma mesa de bar
pedindo à saideira ou um psiquiatra.

Quem sabe esteja do outro lado da rua
(ao alcance de um chamado ou de um assobio)
indignada com os preços da carne;
ou esteja um lance de escada, andar acima –
lamentando a paisagem obstruída.

Procurando bem, com esmero,
sem trégua ou descanso,
tendo por certo que encontrada hoje
a busca recomeça amanhã.


do livro comerciais de metralhadora

Um comentário:

Larissa Marques - LM@rq disse...

gosto demais dessa crueza, desses signos e dessa maneira sonora que se expressa!
mágico!